quinta-feira, 30 de outubro de 2008


NOTAS POLÍTICAS SOBRE JOAQUIM DE CARVALHO – Parte I

"Ser republicano em Portugal é postular não apenas uma concepção política, mas sobretudo uma atitude mental e moral". Foram estas palavras então proferidas por Joaquim de Carvalho (1892-1958), em Janeiro de 1923, no discurso de homenagem ao Dr. José Falcão realizado em Coimbra e publicado pelo jornal A Revolta [nº7, 24-02-1923, p. 5-6]. Esta concepção e ética republicana que ultrapassa a própria política e entra no domínio da mentalidade colectiva de um povo era algo que os ideólogos do regime republicano preconizavam, mas que a realidade e o contexto da época acabaram por limitar, conduzindo muitos à desilusão e ao afastamento da vida política.

Joaquim de Carvalho sublinhava, acima de tudo, "a liberdade de espírito", "o dever", "o sentimento das ideias gerais" e o "espírito crítico" [Norberto Cunha, "Tradição e progresso nas liças teórico-políticas de um clerc: Vitorino Nemésio", Nemésio Vinte Anos Depois, Edições Cosmos, 1998]. E soube manter até ao fim esse seu espírito idealista, esse "desassombro", essa reconciliação da "gente com a humanidade", ou não fosse Joaquim de Carvalho o "Mestre de cidadania liberal ... uma espécie de frade da ordem do Espírito, que tinha por cela o Universo, mas um frade na acepção recolhida, pura e ascética da palavra" [Jaime Cortesão, citado por Barahona Fernandes, Joaquim de Carvalho. Pessoa e Atitude Espiritual, Figueira da Foz, 1963, p.13].

Nasce politicamente Joaquim de Carvalho, na época estudante universitário, num artigo publicado anonimamente, "ESTOTE PARATI?", no jornal A Redenção [Figueira da Foz, 1-2-1910]. O seu sentimento político, passe o facto de ser um texto de juventude, manifesta já as preocupações e os ideais que o vão acompanhar ao longo da vida. Revela-se, portanto, alguma constância do pensamento e sobretudo um conjunto de axiomas que servirão para desenvolver as suas ideias sobre o problema político em Portugal, e que vai desenvolvendo posteriormente, construindo, problematizando e alicerçando o que será tido como num pensamento liberal e democrático, com "um patriotismo fortemente impregnado de [...] sentimentos familiares" [Jorge Peixoto, Joaquim de Carvalho 1916-1934, Arquivo de Historia e Bibliografia 1923-26, INCM, 1976, vol. I].

Curiosamente, o primeiro combate de resistência surge em 1919, e logo vindo de um "sector político e intelectual que o devia compreender e até estar em perfeita sintonia" [Jorge Peixoto, ibidem], na sequência da desanexação da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, medida tomada pelo então Ministro da Instrução, Leonardo Coimbra, ao que se presume instigado pelo reitor Coelho de Carvalho. Na altura publica um expressivo e raro opúsculo onde afirma:

"Decorreu-me a escolaridade entre duas tendências: uma, impulsiva, que me arrastou ao mais ardente jacobismo, outra contemplativa, pela qual me isolava no meu quarto, trabalhando delirantemente. Venceu, afinal, esta última, não sei se por mais forte, se pelas laboriosas desilusões da realidade, embora aquela se não apagasse ainda ..." [Joaquim de Carvalho, A Minha Resposta, Coimbra, Tip. França Amado, 1919, p. 5].

[a continuar]

A.A.B.M.
J.M.M.

via Almanaque Republicano

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